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Fábrica da Torre

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Grupo Direitos Urbanos pede tombamento do Cotonifício da Torre

Situação atual do bairro da  Torre, mostrando a área do Cotonifício como um dos poucos respiros no adensamento desordenado. Notar também a presença de elementos de valor histórico nas estruturas próximas à chaminé.

Situação atual do bairro da Torre, mostrando a área do Cotonifício como um dos poucos respiros no adensamento desordenado. Notar também a presença de elementos de valor histórico nas estruturas próximas à chaminé.

Há pouco mais de um mês, um colunista do caderno de Economia do Jornal do Commercio escreveu uma nota sucinta (e alarmante): “Guerra de Masterplan na Torre – Sob cláusulas de absoluto sigilo, Odebrecht Realizações e Moura Dubeux disputam o terreno de 100 mil m² onde funcionou o Cotonifício da Torre.” Poucos dias depois, o Diário de Pernambuco fez uma matéria sobre os destinos dos diversos cotonifícios abandonados com a decadência da indústria textil em Pernambuco e mencionou que no caso da fábrica da Torre haveria planos para a construção de um empresarial na área.

Para nós do Direitos Urbanos, é preocupante que esse enorme terreno, com arborização vistosa e antiga, e que abriga parte importante da história não só da Torre, mas do Recife e de Pernambuco, seja explorado pelo mercado imobiliário da forma insustentável e pseudo-urbana que lhe tem sido característica. O bairro da Torre é um dos mais tristes exemplos de como o mercado imobiliário escolhe um bairro tradicional como alvo e extrai dele o máximo de retorno financeiro, deixando no lugar uma massa disforme, descaracterizada e hostil. A antiga “freguesia da Torre” foi um dos alvos preferenciais do mercado imobiliário depois da entrada em vigor da lei dos 12 bairros, que restringiu a verticalização nos bairros bastante adensados da Zona Norte. E, com isso, elementos importantes da identidade do bairro foram perdidos, a começar pela ambiência tranquila de um bairro em que predominavam casas. As casinhas da vila operária na rua Vitoriano Palhares, onde funcionou nos anos 90 um conjunto de bares e restaurantes conhecidos como Pólo Torre e que chegavam a rivalizar com outros pólos de entretenimento na cidade, promovendo uma sadia diversidade de usos, deram lugar a três torres residenciais com um projeto arquitetônico genérico. O casarão que abrigava a Catedral da Seresta deu lugar a outro prédio. Recentemente também foi anunciado o fim da unidade do SESI no bairro, vendida para um gigante do capital imobiliário.

O Cotonifício da Torre, por sua vez, é um marco histórico da economia pernambucana. Segundo um levantamento feito em 1916, teria sido a primeira indústria desse tipo fundada no Estado que hoje ostenta em seu brasão um ramo de algodão como símbolo desta terra. Ela também foi o principal indutor da urbanização do bairro da Torre, que, no princípio do século XX, possuia uma infra-estrutura urbana e um adensamento bem maiores do que a de muitos bairros da margem esquerda do Capibaribe, hoje em dia mais adensados. Como é possível observar em fotografias bem aproximadas a partir de prédios ao redor, provavelmente grande parte das estruturas originais da fábrica resistiu ao tempo e só está escondida da vista do público.

Dar o destino correto para os remanescentes do Cotonifício da Torre pode ser determinante para evitar que o bairro se estabeleça definitivamente como um amontoado de torres residenciais genéricas em torno de grandes estabelecimentos comerciais, também anti-urbanos. E mais importante: pode evitar a perda de mais uma oportunidade de sinalizar uma mudança fundamental no modelo de desenvolvimento urbano do Recife. A fábrica deve ser recuperada no seu papel de referencial histórico do bairro e também passar a ser o seu referencial urbano mais forte, um ponto de convergência da comunidade. Algumas diretrizes para a sua transformação nesse sentido são de relativo consenso dentro do grupo: toda a área verde deve ser tornada pública e virar um parque; a vegetação de grande porte deve ser preservada; todo o patrimônio histórico deve ser recuperado, ter sua visibilidade restaurada e ser destinado a algum equipamento de livre acesso ao público, como um mercado público ou uma biblioteca pública, como a de Medellin, na Colômbia. Bons exemplos de reaproveitamento de estruturas industriais não faltam. Essas possíveis diretrizes para que a Fábrica da Torre volte a exercer um papel urbano importante não impediriam, a princípio, que parte do terreno fosse explorado comercialmente por incorporadoras, mas essa exploração deveria se dar já em conformidade com uma concepção da cidade que queremos e não conforme o modelo atual de cidade que se mostrou falido. Isso significa, pelo menos, uma forma de ocupação que não se segregue do espaço público, que ajude a induzir vitalidade urbana nas ruas e não a suprimi-la e que, por fim, reestabeleça a permeabilidade do terreno e sua relação com a margem do rio.

Diante desses riscos, alguns integrantes do grupo Direitos Urbanos resolveram não esperar o avançar das notícias. A primeira fase da ação foi completada ontem, segunda, dia 08 de julho. Após um levantamento sobre a história da fábrica, foi protocolado junto à FUNDARPE um PEDIDO DE TOMBAMENTO DO COTONIFÍCIO DA TORRE, através do documento disponível abaixo. Essa, no entanto, é só uma primeira etapa de um longo esforço coletivo para garantir que o Cotonifício passe a se tornar um referencial urbano para a comunidade da Torre e o símbolo de uma nova maneira de fazer cidade.

Postal datado de 1910, mostrando o Arrabalde da Torre

Postal datado de 1910, mostrando o Arrabalde da Torre

Texto completo do pedido de tombamento entregue à FUNDARPE

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